terça-feira, 29 de junho de 2010

"Almas à venda", 2009, Sophie Barthes

Paul Giamatti vive uma versão fictícia dele mesmo em “Almas à venda”, filme escrito e dirigido por Sophie Barthes. Paul está ensaiando “Tio Vânia” de Tchecov em NY e, de tão ansioso, emotivo e intenso, começa a ter dificuldades em “não levar o personagem para casa”. Isto começa a incomodá-lo profundamente e começa a causar uma confusão entre seus próprios sentimentos e os do personagem – toda angustia, sofrimento e peso recaem sobre ele próprio. Eis que surge um ‘outdoor’ com a propaganda de uma empresa que armazena almas e que é capaz de extrair toda a angustia da qual a alma padece...

Intrigado, Paul faz uma visita ao Dr Fleinstein (David Strathairn), médico responsável pela empresa, e, assim, decide experimentar o procedimento – Extrair sua própria alma, durante 2 semanas, para tentar aproveitar, viver, consumar e incorporar seu personagem no teatro, sem que ‘ele mesmo’ interfira no processo, se livrando de tal 'sofrimento'. Depois de algumas reações, digamos, relevantes, Paul decide fazer uma segunda visita ao Dr Fleinstein, e para sua surpresa e desolação, sua alma foi extraviada – uma funcionária da empresa ‘pegou emprestada’ e a levou à Rússia, onde também ocorre o procedimento, mas no mercado negro. Paul sai, portanto, desesperado à procura de sua alma.

Sophie Barthes entrega, portanto, um filme que explora alguns temas polêmicos – mercado negro / tráfico de orgãos, o duro processo da ‘criação do personagem’, a relação mente/cérebro, qual a função/relevância da alma humana e a maneira como o homem resolve suas angustias, anseios e temores. Tudo muito sutil, amarrado à uma narrativa tão absurda quanto a idéia de uma empresa que vende, aluga e compra almas.

Talvez seja a melhor maneira de se discutir temas tão amplos – causa-se um primeiro estranhamento - mas não cansa, não se coloca numa posição de dono da verdade e apenas arrisca palpites inócuos. É através de um texto até criativo e com frases de efeito com duplo sentido que o espectador do cinema saiu sorrindo e matutando à respeito. Paul Giamatti é responsável por grande parte deste feito, já que vive um homem seriamente preocupado com questões existenciais – através de uma interpretação delicada e de pequenas proporções Giamatti atinge o ‘x’ da questão de maneira implosiva.

Por outro lado há um cidadão chamado Charlie Kauffman, produtor / escritor conhecido e vangloriado por filmes como “Sendo John Malkovich”, “Adaptação” e “Brilho eterno de uma mente sem lembrança”. “Almas à venda” não é um motivo para Kaufmann se intimidar.

Pelo contrário - Sophie Barthes, nada mais é, talvez, que uma grande fã.

Ter idéias é algo legítimo, e não se discute. Mesmo aquelas semelhantes, afinal, o que seria da Coca-Cola sem a Pepsi, do Mc Donalds sem o Bob’s e as Havaianas sem as genéricas? Ou até melhor colocado assim – O que seria de James Brown e Fred Astaire sem Michael Jackson?

Plagiar é sério e errado. ‘Roubar’ conceitos e idéias para gerar uma nova, mesmo a mais absurda, talvez, nem tanto. No momento em que se propõe a ser uma obra, aparentemente despretensiosa, suave e sutil, “Almas à venda” se transforma num filme leve que procura através da jornada de Paul Giamatti, elucubrar de maneira simpática, simples e quase explicativa o significado da alma humana, sua utilidade e sua essência em si, tão simples quanto um grão-de-bico. Jogue a primeira pedra quem não tentou estudar filosofia e desistiu em 30 minutos. Não é para todo mundo.

Um filme com uma bela fotografia e planos silenciosos impactantes.

Inspirado em "Almas Mortas", livro do ucraniano Nikolai Gogol, conhecido autor da literatura russa, “Almas á venda” é um trabalho inteligente que dialoga com atores de todas as crenças e religiões e que procura dar palpites a cerca de uma arte tão preciosa e de difícil execução.

Uma ótima estréia de Sophie Barthes.

A idéia que fica é a seguinte - Para ser feliz, toma-se prozac ou ecstasy. Para dormir, Rivotril. Para transar viagra.

E para não sentir as dores e angústias?

Sophie Barthes responde -

"You were talking about Alphaville and how it’s set in the present day, but different. Would you say that Cold Souls takes place in the future, or is it more kind of an alternate reality of now?

(Voce diria que "Almas à venda" se passa no futuro ou numa realidade alternativa?)

I think it’s completely an alternate reality of now. I think if the procedure was available, and I read it in the “New Yorker” I would believe it. It’s the next Prozac. [laughs]"

-> Eu creio que seja uma completa realidade alternativa do AGORA. Acho que se este procedimento estivesse disponível, e eu lesse uma nota no jornal à respeito, eu engoliria. É o próximo Prozac (rs).

Fica a dica.

PS1: “Nada se cria, tudo se transforma”. (Lavoisier)

PS2: "Existe algo mais importante do que a lógica: a imaginação. Se a idéia é boa, a lógica deve ser jogada pela janela." (Alfred Hitchcock)

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