terça-feira, 29 de junho de 2010

"Almas à venda", 2009, Sophie Barthes

Paul Giamatti vive uma versão fictícia dele mesmo em “Almas à venda”, filme escrito e dirigido por Sophie Barthes. Paul está ensaiando “Tio Vânia” de Tchecov em NY e, de tão ansioso, emotivo e intenso, começa a ter dificuldades em “não levar o personagem para casa”. Isto começa a incomodá-lo profundamente e começa a causar uma confusão entre seus próprios sentimentos e os do personagem – toda angustia, sofrimento e peso recaem sobre ele próprio. Eis que surge um ‘outdoor’ com a propaganda de uma empresa que armazena almas e que é capaz de extrair toda a angustia da qual a alma padece...

Intrigado, Paul faz uma visita ao Dr Fleinstein (David Strathairn), médico responsável pela empresa, e, assim, decide experimentar o procedimento – Extrair sua própria alma, durante 2 semanas, para tentar aproveitar, viver, consumar e incorporar seu personagem no teatro, sem que ‘ele mesmo’ interfira no processo, se livrando de tal 'sofrimento'. Depois de algumas reações, digamos, relevantes, Paul decide fazer uma segunda visita ao Dr Fleinstein, e para sua surpresa e desolação, sua alma foi extraviada – uma funcionária da empresa ‘pegou emprestada’ e a levou à Rússia, onde também ocorre o procedimento, mas no mercado negro. Paul sai, portanto, desesperado à procura de sua alma.

Sophie Barthes entrega, portanto, um filme que explora alguns temas polêmicos – mercado negro / tráfico de orgãos, o duro processo da ‘criação do personagem’, a relação mente/cérebro, qual a função/relevância da alma humana e a maneira como o homem resolve suas angustias, anseios e temores. Tudo muito sutil, amarrado à uma narrativa tão absurda quanto a idéia de uma empresa que vende, aluga e compra almas.

Talvez seja a melhor maneira de se discutir temas tão amplos – causa-se um primeiro estranhamento - mas não cansa, não se coloca numa posição de dono da verdade e apenas arrisca palpites inócuos. É através de um texto até criativo e com frases de efeito com duplo sentido que o espectador do cinema saiu sorrindo e matutando à respeito. Paul Giamatti é responsável por grande parte deste feito, já que vive um homem seriamente preocupado com questões existenciais – através de uma interpretação delicada e de pequenas proporções Giamatti atinge o ‘x’ da questão de maneira implosiva.

Por outro lado há um cidadão chamado Charlie Kauffman, produtor / escritor conhecido e vangloriado por filmes como “Sendo John Malkovich”, “Adaptação” e “Brilho eterno de uma mente sem lembrança”. “Almas à venda” não é um motivo para Kaufmann se intimidar.

Pelo contrário - Sophie Barthes, nada mais é, talvez, que uma grande fã.

Ter idéias é algo legítimo, e não se discute. Mesmo aquelas semelhantes, afinal, o que seria da Coca-Cola sem a Pepsi, do Mc Donalds sem o Bob’s e as Havaianas sem as genéricas? Ou até melhor colocado assim – O que seria de James Brown e Fred Astaire sem Michael Jackson?

Plagiar é sério e errado. ‘Roubar’ conceitos e idéias para gerar uma nova, mesmo a mais absurda, talvez, nem tanto. No momento em que se propõe a ser uma obra, aparentemente despretensiosa, suave e sutil, “Almas à venda” se transforma num filme leve que procura através da jornada de Paul Giamatti, elucubrar de maneira simpática, simples e quase explicativa o significado da alma humana, sua utilidade e sua essência em si, tão simples quanto um grão-de-bico. Jogue a primeira pedra quem não tentou estudar filosofia e desistiu em 30 minutos. Não é para todo mundo.

Um filme com uma bela fotografia e planos silenciosos impactantes.

Inspirado em "Almas Mortas", livro do ucraniano Nikolai Gogol, conhecido autor da literatura russa, “Almas á venda” é um trabalho inteligente que dialoga com atores de todas as crenças e religiões e que procura dar palpites a cerca de uma arte tão preciosa e de difícil execução.

Uma ótima estréia de Sophie Barthes.

A idéia que fica é a seguinte - Para ser feliz, toma-se prozac ou ecstasy. Para dormir, Rivotril. Para transar viagra.

E para não sentir as dores e angústias?

Sophie Barthes responde -

"You were talking about Alphaville and how it’s set in the present day, but different. Would you say that Cold Souls takes place in the future, or is it more kind of an alternate reality of now?

(Voce diria que "Almas à venda" se passa no futuro ou numa realidade alternativa?)

I think it’s completely an alternate reality of now. I think if the procedure was available, and I read it in the “New Yorker” I would believe it. It’s the next Prozac. [laughs]"

-> Eu creio que seja uma completa realidade alternativa do AGORA. Acho que se este procedimento estivesse disponível, e eu lesse uma nota no jornal à respeito, eu engoliria. É o próximo Prozac (rs).

Fica a dica.

PS1: “Nada se cria, tudo se transforma”. (Lavoisier)

PS2: "Existe algo mais importante do que a lógica: a imaginação. Se a idéia é boa, a lógica deve ser jogada pela janela." (Alfred Hitchcock)

"Soul Kitchen", 2010, Fatih Akin


Tido até então como um diretor ‘sério’, Fatih Akin, brinca justamente com este rótulo que lhe deram, e apresenta “Soul kitchen”, sua entrada para um universo mais leve, divertido e menos intenso que suas outras obras.

Fatih, com apenas 36 anos, levou prêmios em Locarno, Berlin e Cannes pelos filmes Short Sharp Shock (1998), Head-On (2004) e The Edge of Heaven (2007, respectivamente). Filmes que abordam diferenças raciais e culturais, disputas e conflitos e principalmente uma discussão entre muçulmanos, turcos e alemães. Necessário dizer - Fatih é natural de Hamburgo e de parentesco Turco, sendo assim tem como interesse apresentar fitas que abordam legítimos choques de tradição.

Não à toa, é em Hamburgo que se passa seu novo filme, a despojada comédia, “Soul Kitchen”.

Zinos Kazantsakis (Adam Bousdoukos) é o proprietário de um restaurante, ‘Soul Kitchen’, instalado num velho armazém. Tem como clientela operários e moradores locais, pessoas simples, com gosto pouco sofisticado mas que batem o ponto todos os dias - A comida oferecida não passa de uma espécie de frango empanado com batatas fritas ou pizza.

Mas Zinos tem um sonho que vai além dessa vidinha frugal – quer se casar com sua namorada, mas esta, aspirante à modelo, se prepara para se mudar para China.

Zinos então, embarca numa de ganhar muito dinheiro para poder se mudar, e assim, contrata o chef de cuisine Shayn (Birol Unel) – conhecido pelo talento gastronômico e pelo gênio azedo e ardido. Assim, ambos dão um ‘upgrade’ no restaurante, modificando o cardápio, dando um ‘tapa’ no ambiente e deixando o local moderninho.

Para completar e atrapalhar a trama, o irmão de Zinos, Illias (Moritz Bleibtreu) é solto em liberdade condicional, e baderneiro como o é, se mete no negócio do irmão. A principio, Illias, promove festas com jazz e soul no restaurante atraindo a clientela, mas depois se mete com gente esquisita e perigosa. Zinos, ao deixar os negócios nas mãos de seu irmão, não imaginou o desastre iminente.

Um filme sem grande apelo social, mas que procura retratar de forma tranqüila, porem impactante, a vida que acontece em Hamburgo – De um lado uma cidade tradicional, do outro uma tomada pelo progresso, pelo caráter multi-cultural com gente de lugares diversos e as boates ‘hypadas’.

Fatih procura nesta fita não impor um olhar a respeito e deixa a trama em si e os personagens tomarem conta do choque cultural implícito.

Há um texto descontraído e com tiradas inteligentes – um lugar comum que permite a graça correr solta. Não é, de fato, um roteiro inteiramente original, esbarra no previsível, mas é um que remonta uma Europa cosmopolita interessante e trágica – uma economia estagnada, um povo sem dinheiro e aparentemente sem esperança, mas que enxerga nas pequenas coisas espaços para seguir em frente. Deleitando-se com sua cozinha, desfrutando dos prazeres da gastronomia e resolvendo os pepinos de seu irmão, Zinos percebe as vantagens de uma vida mais simples, não competitiva e com pouco dinheiro.

Fatih Akin comprova que é um diretor competente, capaz de abraçar diferentes gêneros, e cumpre o que se propôs à fazer - fazer as pessoas rirem.

Não é um grande filme, mas é um despretensioso, bem divertido e com certa originalidade.

"Há mais simplicidade no homem que come caviar por impulso, do que naquele que come nozes por princípio." (Chesterton)

Fica a dica.

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PS – trecho de uma entrevista com Fatih Akin:

Why did you decide to change styles with Soul Kitchen and make a comedy?
Fatih Akin: After the serious films I did, I really felt exhausted by this serious world, I was stuck in a serious world. I wanted to break out of that for one film. To try to do something different and challenge myself. Am I able to do something different? Am I able to make people laugh? I want to become a good director, whatever that means. I think that means, in my opinion, to handle different genres, to handle different things, you know, I have to try this out, I have to go into the risk and try so. I said to myself, “If I don’t do it now, I will never do it. It took a lot off grit and “desperence” because I had success with the serious stuff I did. Then came the risk and I said okay and I’ll be completely different. That’s why I was so happy and so relieved when I realised the reactions yesterday, that it worked much better than I expected.
I was so afraid.

-> Depois do sérios filmes que dirigi, me senti exausto por este universo austero - me sentia preso neste lugar. Quis me libertar através de 1 filme. Tentar fazer algo diferente e desafiador - Serei capaz de fazer isso? Serei capaz de fazer as pessoas rirem? Quero ser um bom diretor, dirigir gêneros distintos, quem não arrisca não petisca. "Se eu não fizer agora, jamais farei", disse a mim mesmo. Foi necessário coragem para abandonar uma esfera a qual cheguei ao sucesso. Por isso estou feliz e aliviado - observar as reações frente a este novo trabalho, foi ótimo, eu não esperava tão boas reações. Eu tinha medo.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

"Kick Ass", 2010, Mathew Vaughn


Kick Ass”, dirigido, escrito e produzido por Mathew Vaughn, traz uma história relativamente simples: Dave Lizewski (Aaron Johnson) é um típico nova-iorquino nerd, fã de histórias em quadrinhos, que através de um insight, tem uma idéia [brilhante] - se tornar um super-herói, intitulado Kick Ass.

Após uma 1ª tentativa frustrada, Kick Ass é atropelado e levado às pressas para a mesa de operações. Seu corpo completamente destruído, passa por uma intervenção cirúrgica, onde placas metálicas são atarraxadas aos seus ossos. Soando familiar?

Dave segue, portanto, com uma armadura interna e com uma nova habilidade conquistada após o acidente – Seu sistema nervoso foi danificado perdendo a sensibilidade para a dor.

Dave agora é um semi-super-herói e parte em busca dos fracos e oprimidos.

Paralelamente, Big Daddy, vivido por Nicholas Cage, uma cópia idêntica de Batman, é um super-heroi – sem super-poderes, com apenas armas e 'gadgets' - e junto à sua filha Mindy, codinome ‘Hit-Girl’ (Chloe Grace Moretz), de 11 anos, combate o crime em NY há algum tempo. Tem com objetivo principal acabar com o bando de Frank D’amico (Mark Strong) um rei do crime poderoso em Manhattan - D’ámico foi responsável pela morte de sua esposa.

D’amico ouve falar num herói - Big Daddy - que anda liquidando seus capangas e assim coloca sua cabeça à prêmio. Dave se mete, por acaso, com homens de D’amico, aumentando a ira do rei do crime que resolve exterminá-lo também - D'amico acredita que ambos estão juntos na parada.

Um roteiro típico de HQ misturado à uma clássica sinopse de filme de ‘besteirol’. Mathew Vaughn, conseguiu brilhantemente unir o que é há de melhor em ambos os segmentos: cenas de ação bem dirigidas, carros, explosões e personagens metidos à ‘Rambo’, com o melhor do humor negro e sarcástico americano. Quando tudo parece cair no previsível, uma sacada ou uma piada bem colocada preenche os espaços vazios. Fica claro que é um filme que não se leva à sério – Uma sátira sobre momentos atuais.

Aliás, graças a deus, Van Damme nunca se levou à sério.

O que Matthew Vaughn faz é notório – Brinca com a imaginação de milhões de espectadores que já sonharam em ser Luke Skywalker, Superman e Wolverine. Acerta, justamente, quando apóia esta paixão nos heróis não só numa certa alienação mas na sensação de falta de proteção.

Apresenta não só de maneira criativa um retrato da corrupção entre policia e traficantes como não julga nem critica as obras de ‘pancadaria’; simplesmente ilustra que não são elas as responsáveis pela violência, e sim a falta de cultura e interesse do governo americano em educar seu povo de maneira construtiva.

É claro que é mais fácil culpar os jogos e os filmes. Mas ninguém acredita que o mundo seria melhor SÓ com filmes do Schwarzenneger – somos apenas partidários da liberdade de expressão - estes filmes, assim como os do Woody Allen e Oliver Stone, estão aí para fazer o mesmo, mas de forma diferente.

Na realidade, não é nada arriscado dizer que depois de "Kick Ass", um sub-gênero será criado.

Um que faz do humor o caminho para a crítica. [sim, esta é a origem da comédia, mas certas pessoas tem o prazer de esquecer]. "Kick Ass" é, para os americanos, o passaporte para a análise. O personagem de Aaron Johnson representa a alienação, o de Nicholas Cage o acesso às armas e a questão da justiça e corrupção e o de Chloe Grace Moretz a chegada prematura da vida adulta – assunto repetido e debatido pela maioria dos psicólogos, médicos, pais e estudiosos atuais.

Sim, há tudo ali – jogado e escancarado da maneira que os americanos mais gostam – entre tiros, chutes, granadas e piadas grosseiras e grotescas. Uma série de assuntos pertinentes e bem argumentados. O sangue e a crueldade ali apresentadas faz referencia à um mestre – Quentin Tarantino – que junto a Mathew Vaughn e os Irmãos Cohen em “Onde os fracos não tem vez” tentam, eu disse, “tentam”, deflagrar a banalidade da violência nos EUA. Um besteirol, que passa longe de ser uma besteira.

Vivemos uma época onde os fins justificam os meios.

Ao mesmo tempo que “Kick Ass” é um filme-entretenimento de ponta – extremamente bem realizado e bem escrito – é também uma mensagem, um grito de socorro e uma ironia. O personagem ‘Dave’ representa a humanidade na sua fragilidade, nos seus sonhos e medos, e de como, às vezes, ser um super-herói dá uma sensação de proteção, mesmo que legitimamente falsa. Um justiceiro que combate o crime simplesmente executa aquilo que a ‘Policia’ não é capaz de fazer – isso é algo absurdo de se pensar?

Roger Ebert, crítico do Chicago Sun Times, não gostou do filme. Diz ele –

Will I seem hopelessly square if I find “Kick-Ass” morally reprehensible and will I appear to have missed the point? (…)” (Parecerei desesperançosamente careta ao considerar "Kick Ass" moralmente repreensível? Terei eu não entendido o ponto?)

I'm not too worried about 16-year-olds here. I'm thinking of 6-year-olds. There are characters here with walls covered in carefully mounted firearms, ranging from handguns through automatic weapons to bazookas. (…) (Não estou preocupado com adolescentes de 16 anos de idade. E sim, nas crianças de 6 anos. Há personagens que possuem paredes carregadas com armas, bazucas, pistolas, fuzis...)

Then the movie moved into dark, dark territory, and I grew sad”. (Em seguida, o filme caminhou para um lugar, um território escuro, escuro e negro que me deixou triste.)

A preocupação dele é com a censura.

Ora, que coisa...

Fica a dica!

Master Blaster.


PS - quando Batman, no filme ["Cavaleiro das Trevas"], invade Hong Kong e sequestra o bandido para levá-lo à julgamento nos EUA: .... tudo bem...?

-> Os americanos aprenderam à rir de si mesmos.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

"Toy Story 3", 2010, Lee Unkrich


É comum ouvir por aí que em time vencedor não se mexe. Também se diz que continuações, mesmo repletas de boas intenções, jamais atingem a expectativa do público e esbarram em erros e numa 'carinha' de filme B.

Mesmo assim, abaixemos as cabeças -
Não é que acertaram?

Toy Story 3 é, talvez, o melhor filme da trilogia.

Andy, agora, prestes a fazer 17 anos, se prepara para a faculdade e isso significa uma única coisa para seus brinquedos – um adeus definitivo. Entre eles, os queridos Mr & Mrs Potato Head, Rex, Bulls-eye, Jessie, Buzz & Woody, a notícia surge como uma derrocada.

Passam, então, a especular sobre seu futuro incerto – O sótão ou o lixo. Eis que Andy os coloca num saco para guardá-los mas, numa confusão, a sacola é trocada com uma de lixo e os pobrezinhos acabam parando na sarjeta e entregues ao caminhão de lixo.

Indignados com essa desfeita, os brinquedos resolvem dar um outro jeito de resolver essa situação. Surge uma caixa no carro da mãe de Andy – intitulada ‘DOAÇÕES’.

Rancorosos, partem em busca da tal creche.

Porém, chegando lá, só se metem em confusões - conhecem o urso de pelúcia Lotso, imperador do lugar, fofo e aparentemente sinistro - deixando, então, nas mãos de Woody a resolução e salvação da pátria.

“Toy Story 3” é um longa de animação que poder ser conferido por todas as idades – leve, cômico e divertido; foi capaz de deixar a platéia do Roxy 1

às gargalhadas.

Mesmo tendo um roteiro batido, um vilão duas-caras que quer dominar um território, mas que faz referencia há bons filmes de ação, Woody e Buzz aparecem mais engraçados, sagazes e entrosados, promovendo através das vozes de Tom Hanks e Tim Allen, respectivamente, uma nova empolgante e diferente aventura. Quem aparece nesta continuação e com uma participação hilária é Barbie e seu namorado Ken, ou Kenneth...

Percebe-se que, ambos Lasseter e Arndt, investiram não só numa pesquisa sobre brinquedos antigos - apresentam ótimas piadas e transformaram a sessão de cinema numa viagem nostálgica e deliciosa.

Fica claro que, de tão embebidos deste universo de Woody e seus amigos, ambos envelheceram como um bom vinho - preservaram ideías e as qualidades de cada personagem com graça e espontaneidade - os apresentam tão queridos quanto antes. Um filme criativo e sagaz, feito por autores que souberam explorar um espaço alegre, bem-humorado e empolgante - para as crianças, indescritível, para os adultos, um gostoso programa de domingo.

O efeito 3-D não faz muita diferença, recurso desnecessário mas que pode compor uma ou outra cena.

Por fim, não poderia ser de outro jeito - o filme da Disney é concluído com uma mensagem sobre passagem e amadurecimento, algo realizado com certa poesia e brincando com o lúdico - algo que pode gerar nos pequenos algo valioso, de fato.


É a magia Disney.


Fica a dica!

PS: Segue abaixo um teaser do filme “Up – altas aventuras” - onde já é possível ver Lotso, no quarto de uma menina. Uma daquelas curiosidades espalhadas no universo Disney. Existem outras espalhadas em “Toy Story 3”. Vamos ver quem encontra...

http://videos.sapo.pt/MeDG43E9fzqeEYhyUsin

Mais uma coisa - Parabens aos criadores - Há uma versão de Buzz-Lightyear 'made in Spain' - Sen-sa-cio-nal!!

"O escritor fantasma", 2010, Roman Polanski



Ewan McGregor faz um jovem escritor-fantasma bem sucedido que concorda em trabalhar para o ex-primeiro-ministro britânico, Adam Lang (Pierce Brosnan). Ele terá de reescrever e reorganizar as memórias já escritas pelo político, processo que fora interrompido pela morte do seu antecessor – o pobre foi encontrado afogado no mar perto da residência do ex-primeiro-ministro. Mesmo assim, ele aceita o emprego, tarefa a qual receberá a quantia de US$250.000, e procura ser o mais profissional possível. Porém, outros elementos surgem e suscitam em McGregor um espírito investigador e, assim, parte numa determinada busca para descobrir que espécie de tramas, politicagens e conspirações aconteceram por ali. Ao reler e examinar as memórias de Lang e após conseguir penetrar no âmago da família, McGregor descobre algo muito maior que imaginava e se vê diante de uma sinuca daquelas.

Baseado na obra Best-seller “The Ghost” de Robert Harris, conhecido por escrever obras sobre amarras políticas e conspirações implícitas, Roman Polanski transporta para o cinema uma história de caráter investigativa, crítica às manipulações políticas e que faz referencias ao mandato de Tony Blair na Inglaterra – algo atual e instigante. O escritor fantasma” traz leve suspense capaz de prender a atenção do espectador do começo ao fim – fato!

Talvez, por isso, levou o Urso de Prata no Festival de Berlim, como diretor, este ano.

Porém, Polanski, deixa o filme arrastado, com mais de duas horas de duração e com um roteiro até que previsível - “O escritor fantasma” oscila, portanto, em qualidade - entre ser um filme com um roteiro extremamente bem escrito, desenvolvido, costurado e que não cansa a platéia – mas um que também não surpreende – deixa todos ávidos para saber a resolução da bendita história, mas ao final “morre na praia”, como se diz. Para aqueles vacinados contra filmes de thriller policial, este é apenas um passatempo ‘maneirinho’ que é bem conduzido até o final. Conta como pontos a favor o elenco - Ewan McGregor, como de praxe, executa seu papel com maestria e segura o filme com as mãos – assim como Pierce Brosnan, ator tido como limitado, que não faz feio e contracena dignamente com McGregor. A atriz Olivia Williams a pouco vista em “Educação” de Lone Scherfig (indicado a melhor filme Oscar 2010) como Miss Stubbs, professora de Jenny (Carey Mulligan), interpreta Ruth Lang mulher de Brosnan, e o faz com firmeza de uma atriz com muito talento – aguardem- na! Link de entrevista de Olivia Williams - http://www.youtube.com/watch?v=qFa1iZGIrQA

Polanski, conhecido por sua habilidade em criar tramas com suspense no ponto certo, sutilezas, tensões e reviravoltas surpreendentes – (Chinatown – sua homenagem aos filmes noir, Bebê de Rosemary – clássico do terror-suspense) traz um filme inteligente, provocador e atual mas parece ter optado em algo mais mamão-com-açucar e fraquinho. Isso que dá se acostumar com um Polanski de outrora...

Depois de filmes como “Os homens que não amam as mulheres” do escritor Stieg Larsson, ficou mais difícil cativar espectadores exigentes por tramas sensacionais.

Mesmo assim, um bom programa. Um filme interessante. Nada surpreendente, mas é um Polanski.


A dica fica.

sábado, 19 de junho de 2010

"Rock Antygona", 2010, Guilherme Leme

Gosto, se discute?

Há quem diga que só se lamenta.

E com certeza não é o caso desta montagem contemporânea de “Antígona” de Sófocles.

É distinto aquele artista que ousa, se arrisca e se arremessa num mundo de incertezas, já que através deste risco é possível encontrar, talvez, uma outra maneira de fazer, sentir e expressar uma idéia. Através da invenção e de uma reinvenção se é possível um novo olhar, e um novo fazer.

Rock Antygona” é a tentativa brava, firme e ousada de trazer aos palcos cariocas uma representação contemporânea da tragédia grega homônima. Arrisco dizer até, que numa tentativa de fazer de um jeito diferente – Uma espécie de short-term-play, é feito na sala Marília Pêra do Teatro Leblon, uma versão resumida, reduzida e, portanto, a síntese da história da heroína. Algo perigoso, mas que na simplicidade conta a história de maneira inteligível e remonta a tragédia, principalmente para aqueles que não a conheciam, de forma que é fácil de ser deglutida. Não há palácio, vestimenta da época e nada que seja previsível. Há, sim, um escritório, ou sala de reuniões moderna, onde os personagens se encontram e procuram ‘resolver’ seus conflitos. Há até um DJ-coro-narrador, que ajuda a contar a história cadenciando e pontuando momentos com efeitos sonoros – algo sui generis. Desta forma, há uma busca pela casualidade no texto. Algo que, talvez, através das vozes empostadas, não atinja este caráter moderno numa totalidade, deixando um pouco a desejar mas que não atrapalha o entendimento de forma alguma.

Luis Melo faz Creonte, Armando Babaioff faz Hemon e Larissa Bracher faz Antígona. Luis Melo consegue entre gritos, gemidos e sussurros pontuar com clareza momentos importantes e se destaca utilizando uma palheta de sentimentos e emoções bem vasta – bom de se ver. O jovem ator Armando Babaioff, mesmo tendo um porte pequeno, trabalha através da voz e do corpo um personagem forte, distinto e bravo – convence - Há uma construção correta e na medida certa. Larissa Bracher também atinge em certos pontos um lugar plausível, mas se deixa levar pela emoção e acaba por declamar o texto - algo que faz perder a força e o impacto no espectador. Há, talvez, pausas desnecessárias que costuram o texto dos 3 atores, enfraquecendo a tensão e o equilíbrio de um texto intenso e que pode ser ‘jogado’ numa ‘respirada’ só. São 3 atores em cena, cada um com pouquíssimo texto, a excessão de Luis Melo, que faz Creonte. O que impera é um trabalho corporal intenso, quase como um balé, que os atores esbanjam em talento. Longos minutos em silêncio onde o corpo expressa a dor e angústia que são necessárias para compor o cenário. A iluminação, a trilha sonora e os pés dos atores, firmes no chão, auxiliam a trazer o ‘peso’ necessário.

Atuar, assim como pintar, esculpir e dançar são ‘crafts’ difíceis. E sob dois aspectos básicos – no que concerne a destreza e aptidão para tal e a capacidade de compreensão de significados e de entendimento de idéias. A capacidade de dar sentido aquilo que deverá ser construído e constituído como obra artística.

Re-construir “Antígona” é algo mais que desafiador e deve ser lembrado com louvor.

Qual a diferença entre um vaso de flor pintado por um artista e grampeado a um calendário e um vaso de flor pintado por Van Gogh? O que é arte e qual a qualidade/finalidade da arte?

E coloco - A arte desaparecerá à medida que a vida ganhar equilíbrio." (Mondrian)

"A arte é a contemplação: é o prazer do espírito que penetra a natureza e descobre que ela também tem uma alma. É a missão mais sublime do homem, pois é o exercício do pensamento que busca compreender o universo, e fazer com que os outros o compreendam." (Auguste Rodin)

Ao ousar e buscar o diferente, mostra-se que se está vivo e pensante. O diretor Guilherme Leme e o dramaturgo Caio de Andrade foram felizes nas suas aspirações – traduz através do corpo dos atores uma história bem contada.

Gosto não se discute, se experimenta.


A dica fica – para os disponíveis à uma experimentação.