segunda-feira, 18 de outubro de 2010

"Tropa de Elite 2", 2010, José Padilha


Tropa de Elite - o primeiro - foi uma "brincadeira". Uma espécie de exercício em que José Padilha ousou criar, ou melhor, recriar o clima e ambiente carioca – tiros, drogas, favelas e o caveirão. Fruto de Cidade de Deus.

-> Um filme que despontou como sendo o melhor filme já produzido no Brasil.

No que concerne a produção, talvez; ao roteiro, jamais.

Mas, tudo bem, deixemos Padilha pensar assim.

Afinal, de tão eufórico com seu próprio falo, ele não sossegou e traz hoje a continuação da história – Tropa de Elite II, a missão. Aliás, “O inimigo agora é outro.”

Neste, Cap. Nascimento é "expulso" do BOPE e realocado para a Secretaria de Segurança Pública, um lugar onde assume o mais burocrático dos trabalhos, além de uma posição "privilegiada" para observar a sujeira, podridão e canalhice a que estamos submetidos – o cenário político brasileiro e, especialmente, o Rio de Janeiro com seus governantes e polícia e as milícias criadas pelos mesmos. E, como se não bastasse esse universo angustiante e sufocante, seu filho, agora com 8 anos, compreende o que seu pai faz da vida, e torna os momentos de lazer de Nascimento um drama familiar, em que só consegue ver o pai como um monstro.

Et voilà, temos o filme.

Um filme aprimorado no que concerne à técnica e à linguagem. Tomadas, planos, câmeras na mão, gruas espetaculares e, em suma, uma filmagem opulenta - fotografia bem pensada e autoral. Um roteiro com alguns furos e absurdos, mas que existem para deixar a história apimentada – beiram o melodrama novelístico, mas que não depreciam de forma alguma o resultado final.

Como disse um jornalista, Tropa de Elite 2 é fundamental.

Escancara, exibe e arremessa na tela do cinema, na cara do espectador a realidade do sistema político carioca. Denuncia a fragilidade de uma cidade que de maravilhosa tem somente o "caráter" de seus administradores.

Wagner Moura lidera um time de atores espetaculares e que dispensam outros ou mais elogios.

Desta vez Padilha pode comemorar e demonstrar sua arrogância habitual –

TE 2 é um filme como nenhum outro.

Mesmo copiando algumas coisas de Batman – O cavaleiro das trevas, do genial C. Nolan, e fazendo de Wagner Moura um justiceiro vingativo à lá Chuck Norris/Charles Bronson (nada contra!), TE 2 é imperdível.

Fala ao brasileiro sem censura e isso é fundamental.

Fica dica!!!

"Lope", 2010, Andrucha Waddington


Definitivamente o cinema brasileiro decolou.

Lope de Vega é conhecido como o fundador da comédia teatral espanhola. O filme narra sua trajetória de soldado do exército a autor, além de exibir seu "talento" com as mulheres e uma época paternalista, hipócrita e tradicional do império espanhol. Lope colheu na corte e na burguesia espanhola a inspiração para suas famosas peças recheadas de críticas, sátiras e escândalos conjugais.


Tanto fez, que em dado momento foi preso por difamação e por zombar da honra de famílias tradicionais. Felix Lope de Vega, assim como seu contemporâneo W. Shakespeare, escreveu milhares de peças e marcou uma época.

Mesmo sendo arrastadinho, "Lope" é um filme comovente sobre amores, sonhos e garra. A começar pela fotografia assinada pelo brasileiro Ricardo della Rosa – deslumbrante, impactante e que fala por si só. Um filme bem amarrado e com belas performances - O elenco é de primeiro time: tanto os atores espanhóis, Alberto Ammann (Lope De Vega), Leonor Watling (Isabel) e Pilar López de Ayala (Elena) como Sonia Braga e Selton Mello executam seus papéis com verdade e serenidade.

Lope” traduz com ricos detalhes sua história - uma produção chocante.

Andrucha Waddington cercou-se de profissionais excelentes, que - unidos junto ao seu talento notável - realizaram um épico de grande qualidade.

Lope” é, sem mais explicações, um filme que não parece brasileiro.


Parabéns!


Fica dica!

domingo, 10 de outubro de 2010

"A suprema felicidade", 2010, Arnaldo Jabor


A suprema felicidade” conta a história de Paulo, um menino que observou desde muito cedo o casamento de seus pais desmoronar. O filme narra a trajetória desse menino e ilustra como ele aprendeu a lidar com sua mãe carente, assim como com suas amizades, uma escola católica rígida, as namoradas, as desavenças e o amor. Tudo isso guiado por um avô batuta – Marco Nanini.

Ser "crítico é ser um fiscal e um ferrenho observador. Tem como premissa básica não se abster de dizer aquilo cravado, aquilo que deve ser dito, por mais penoso que seja, com o intuito de salientar feitos e arruinar avarias, tudo sem iniquidades.

Em outras palavras, aquilo que a maioria das pessoas com bom-senso deixam de fazer.

Arnaldo Jabor, logo, é algo discutível. No que concerne a sua "afeição" pela política e os caminhos do Brasil, há quem diga que não passa de um pseudointelectual e que braveja feito um papagaio de pirata.

Outros o endeusam, e isso não é preciso explicar.

Mas quando alguém, como ele, faz um filme orçado em R$ 12 milhões de reais, e apresenta aquilo – e, vejam bem, não é feitio deste blog assacar ninguém - algo sinistro paira no ar, algo que insiste em compreender o porquê de um filme, na melhor das descrições – primário.

Na abertura do Festival do Rio, massas de nuvens negras pairaram, chocaram-se e causaram certa turbulência para os espectadores a bordo do voo A suprema felicidade.

La Dolce Vita, de Fellini, é um filme melancólico, mesmo estando sob o gênero "comédia. Lida com vidas vazias e uma sensação de futilidade e frivolidades. Mastroianni viveu um homem que não via naquela vida, naquele tempo, um palco amistoso: via, pelo contrário - um lugar amoral - tudo muito vago, devoluto e sem perspectiva - Onde o valor era estabelecido pelo puro entretenimento; via a insatisfação e a alienação.

Amarcord é um filme que traz recordações – que procura dar um olhar sobre a política, a religião e a educação de uma época –, imagens soltas, que não se preocupam com o sentido entre si, mas que são nitidamente algo particular da vida do próprio Fellini.

A suprema felicidade "brinca" e almeja brincar com esse lado "Fellinesco". Coisa dita pelo próprio Jabor.

Há, de fato, alguma relação – alguma!

O menino Paulo (Jayme Matarazzo) apresenta certa insatisfação e uma angústia perante a vida comum a qualquer adolescente. Assim como, um retrato de um Rio de Janeiro diferente, antigo e "ingênuo" também é apresentado – época em que Jabor era jovem – a qual aparece claramente e é exibida com bom humor, graças ao ator João Miguel, fazendo do filme, uma sessão nostálgica até que gostosinha. Vemos, portanto, imagens daquele tempo.

Fica nítido que Jabor se preocupou em juntar, ao longo de sua vida, trechos de momentos especiais para algum dia depositar num filme. A suprema felicidade, portanto, são pequenas partículas de suas memórias – um filme sustentado em lembranças, "casos" e piadas que permearam a vida do diretor por volta de 1950.

Che è ! Alguns elementos realmente levam a crer que Jabor retirou "tanta" inspiração do diretor italiano.

Mas, por mais graciosos e nostálgicos que sejam, não sustentam o filme, nem por 1h quanto menos por 2h.

São apenas memórias.

Numa das entrevistas que deu, Jabor ainda soltou a seguinte pérola –

"A Suprema felicidade, é um filme de ator!”

Infelizmente, nota-se que ficar 25 anos sem filmar acaba lesionando certas partes do cérebro.

Os atores Dan Stulbach e Mariana Lima são bons intérpretes. Porém, neste filme, mostram-se extremamente teatrais, em cenas pobres e mal dirigidas. Nem eles conseguiram salvar um texto que beira a vergonha. Cenas sofríveis - agonia de ver. Elke Maravilha passeia pelo filme como uma modelo pela passarela. Jayme Matarazzo não é mau ator - mas também não "acontece".

A cena final - Nanini em tamanho gigante "dançando" sobre a Baía de Guanabara é para mor-rer.

Enfim, um filme que procurou ser uma coisa, mas que passou longe de sê-la. Que coisa é essa? Não sei. Ninguém sabe.

Longo, mal escrito, mal dirigido, caricato, antiquado e sem argumento.

Dizer que é uma homenagem a Fellini, é como não dar mérito a ambos La Dolce Vita e Amarcord que, no fundo, nada têm a ver com A suprema felicidade.

A Suprema Felicidade, é ultrapassado e scialbo. Como linguagem, direção e conteúdo. Coisa que os filmes de Fellini não são, needless to say.

Não é à toa que Jabor disse que "penou" para voltar a dirigir.

Vamos esperar o segundo.

A dica não fica DE JEITO NENHUM.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

"Comédia Russa", 2010, João Fonseca

Escrita pelo ator Pedro Brício, "Comédia Russa" é um deleite.


Conta a história de Aleksei (Rodrigo Nogueira), rapaz formado em administração que, concursado, é contratado para trabalhar numa repartição pública em Moscou. Lá, ele topa com figuras ordinárias e comuns, todas com suas crises existenciais, críticas ao trabalho e uma pontinha de esperança. Um ambiente, embora quase depressivo, com aparente ‘entrosamento’ entre os funcionários – uma composição bem realista.

Eis que o fresco rapaz, Aleksei, ainda surpreendido com tais personalidades e com uma real burocracia em live-action, vê-se metido numa enrascada – Recebe uma ligação anônima que o alerta de um atentado contra sua vida, já que sua entrada na repartição representa a demissão de outra pessoa. Além disso, uma funcionária é encontrada morta, o que mobiliza a repartição – Os 'bons tratos’ passam a ser ataques e desconfianças. Aleksei tem, portanto, suas aspirações liquidadas e ainda arranja um nó cego para administrar. Assim, um clima de acusações, discordâncias e antigas rixas irrompe e torna aquele lugar ‘pacífico’ um bordel, um circo e uma zona de guerra, literalmente. Entre dramas particulares, neuroses pessoais e a busca por uma solução, Aleksei invade a vida dessas pessoas num momento mais que desastroso.


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O que aparentara ser uma comédia com crítica social, torna-se uma espécie de homenagem ao filme “Os Sete suspeitos” mas de ordem 'pública' e governamental – genial!

Pedro Brício é um autor criativo. Construiu, através de um texto bem amarrado e astuto (ao menos até próximo do final), um habitat envolvente - que faz parte do imaginário coletivo sob o qual todos compreendem bem este ‘serviço’ que o governo presta (ou não presta), este ócio e a política podre e interesseira desta máquina. O suspense é sagazmente carregado através da irreverência de cada personagem e suas revelações palpitantes.

Os atores - especialmente Rodrigo Nogueira, Natalia Lage, a bicha, a funcionária morta e a hippie maluca - dão um show à parte. Vivem personagens que não só casam bem com seus physiques como exploram cada pedacinho, cada palavrinha que Brício escreveu e pensou. Os cinco são cômicos, fazem um humor negro não tão pesado e - o melhor de tudo – mostram uma segurança tal que parecem se divertir junto à plateia, fazendo daquele momento uma grande brincadeira.

De fato uma das melhores peças em cartaz no Rio. Divertida, espontânea e com ideias bacanas e geniais.

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Ao final, quando tudo parece chegar a um wrap fenomenal, surgem, infelizmente, ainda mais reviravoltas, mais palhaçadas, novas evidências e o clima, que caminhava tão bem e, acreditem, conciso, perde-se numa bagunça generalizada, numa gritaria monstruosa e num circo de calouros - onde piadas são jogadas e arremessadas sem muito sentido.

Aquilo que estava engraçado perde o ritmo e cansa.

Uma pena.

Parece que Pedro Brício, imbuído de uma criatividade maravilhosa, resolveu abraçar muitas ideias, diversas situações e piadas mil, que separadas funcionam, mas que depois de 1h30 de espetáculo o público ‘já entendeu’ e urra por um desfecho tão bom quanto o começo e o meio.


Embora isso seja um ponto que deprecie a peça, a impressão que fica é ótima e a experiência é mais que aprazível.


SUPER fica dica.

"The Killer Inside Me", 2010, Michael Winterbottom

No que concerne não só a histórias de ficção, mistérios escabrosos, detetives, crimes e mocinhas mas, especialmente, a um clima de suspense conduzido e narrado pelo próprio assassino, um nome surge altivo – o do norte-americano Jim Thompson.

Célebre autor da década de 50, Jim Thompson escreveu diversas obras que fizeram sucesso justamente por seu caráter de thriller de suspense ‘psicológico’. Um autor que arriscava entender as mentes mais desequilibradas e as raízes de um comportamento assassino. Jim Thompson fazia o que nenhum autor moderno ousou fazer: contava as histórias a partir do ponto de vista do sicário, exibindo suas motivações, seu juízo e sua frieza habitual - tudo isso com um humor negro na escala certa. Para Jim Thompson, não havia o bem ou o mal, existiam as ocasiões.

Atingiu seu ápice, precisamente, com "The Killer Inside" (1952). O psycho Lou Ford, é um xerife de uma pequena e amável cidadezinha americana. É amigo de todos, tem namorada, bom emprego, mas isso não parece cobrir todos seus desejos – há, porém, uma voz interna e uma ânsia para matar fria e deliberadamente. Eis que Lou mata o filho e a namorada de um outro xerife, o que causa um frisson colossal na cidade e que levanta suspeitas, justamente, contra ele mesmo. Com astúcia e inteligência, Lou é capaz de driblar a polícia local e se mantem impune. Todavia, Lou não contava com a participação de outros policiais e testemunhas surpreendentes. Aparentemente não satisfeito com esse quadro, entre interrogatórios e acusações, Lou passa a adquirir mais uma 'vontade estranha' e começa a planejar a morte de sua namorada.

Fato que o leva, necessariamente, a medidas desesperadas.

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Genericamente’, um livro ou filme assim baseia-se no "quem será o assassino?".

Vide os eternos Miss Marple e Hercule Poirot de Agatha Christie.

A narrativa centraliza-se nos crimes em si, no desenrolar dos fatos e numa investigação infrutífera, já que Lou se cerca por todos os lados. Mas não parece importante que os mocinhos descubram o mistério – eles já ‘sabem’.

"The killer inside me" preocupa-se mais com "por que raios o rapaz faz essas coisas" e "qual será o [triste] fim dele" - algo que promove diversos momentos impagáveis que revelam sua ‘lógica’ e a arquitetura de sua mente. Uma imaginação fértil que pode desafiar qualquer código de conduta.

Michael Winterbottom, o diretor, alega ter havido receios em relação a produção de "The Killer inside me". Disse que o maior desafio seria transpor para o cinema o universo de Lou, sua 'doença' e sua mente pervertida e mirabolante - conteudo explorado magnificamente por Jim Thompson.

"The Killer inside me" traz, basicamente, uma coisa relevante - Casey Affleck.

Graças a esse excelente e fresco ator, Winterbottom foi capaz de dar vida (e morte) à mais famosa história de Jim Thompson.

O ator é responsável por dar a Lou não só a frieza, loucura e falta de afeto costumeiras, como uma comicidade ímpar, com, literalmente ‘caras e bocas’ literalmente indescritíveis.

Permeado por bons atores, como Ned Beatty, Jessica Alba e Kate Hudson, "The Killer inside me", não se apresenta como um grande filme, nem especialmente arrebatador. Possui um texto que também não tira nota maior que 6.0, embora seja dirigido de maneira inteligente e correta. Winterbottom foi capaz de empregar agilidade e tensão de maneira efetiva, fazendo jus ao thriller escrito por Thompson.

Fica a dica de um legítimo Pulp Fiction.


Ps: entrevista com Casey Affleck

- http://www.femail.com.au/casey-affleck-the-killer-inside-me.htm

terça-feira, 5 de outubro de 2010

"O retrato de Dorian Gray", 2010, Oliver Parker


Dorian (Ben Barnes), menino dócil e romântico, herda fortuna de uma família e se depara com um universo de requinte e glamour, com o qual jamais imaginara se envolver. Aos poucos, pessoas à sua volta se encantam com sua beleza estonteante, uma espécie de efeito similar ao mito de Narciso. Somado a isso, há um senhor de caráter duvidoso, Lord Henry Wotton (Colin Firth), um aristocrata típico da época, que atropela os ainda ingênuos valores de Dorian e o incita a um comportamento lascivo.

Este o pano de fundo do romance de Oscar Wilde, escrito em 1890. ambientada numa Inglaterra aristocrática. Um romance que tinha como objetivo desnudar uma classe intelectual alienada, preconceituosa e hipócrita.

Eis que um dia, Dorian, é presenteado com um auto-retrato, pintado pelo artista Basil Hallward (Ben Chaplin - ótimo ator). Um retrato fabuloso e que seria responsável por....

"Eu irei ficando velho, feio, horrível. Mas este retrato se conservará eternamente jovem. Nele, nunca serei mais idoso do que neste dia de junho... Se fosse o contrário! Se eu pudesse ser sempre moço, se o quadro envelhecesse!... Por isso, por esse milagre eu daria tudo! Sim, não há no mundo o que eu não estivesse pronto a dar em troca. Daria até a alma!" .

Um pacto se sacramentou para que Dorian nunca mais envelhecesse.

O filme, dirigido por Oliver Parker, faz uma adaptação justa ao livro - brinca bastante com a questão psicológica de Dorian e discute a questão da vaidade e da promiscuidade. À primeira vista, é um filme moralista que induz o espectador a pensar que uma conduta 'livre' e hedonista levaria à destruição de si e dos outros. -> Mas só até o momento em que Dorian procura se confessar a um padre. Na realidade, o grande lance da história é a oscilação que Dorian sofre - uma ingenuidade seguida de um caráter pernicioso e cruel. Algo mais que conflitante - um choque de valores e ideias. Qual a conduta correta? O que é bom? O que faz mal? -

Livro e filme são voltados a dois grupos de pessoas:

1) adolescentes e

2) sujeitos de antolhos.

Alguns fatos simplesmente têm de ser jogados na cara, Oscar Wilde estava certo.

De fato, O. Parker não aprofunda as mudanças de humor e caráter de Dorian nem explica a surpresa de Lord Henry Wotton ao se deparar com o monstro que o rapaz se tornou. Há portanto alguns furos, mas nada que deprecie a qualidade da fita. Peca também, pois, na narrativa - o 'desfecho' além de previsível não provoca nada além do óbvio - Simples demais e algo que não acrescenta nada a ninguém.

Colin Firth vive Lord Henry Wotton - fazendo-o tão bem que foi quase impossível reconhecê-lo.

E Ben Barnes é Dorian Gray - atuação modesta de um rapaz inexperiente e cândido. Porém, capaz de convencer plateias não muito criteriosas.

"Não existe livro moral ou amoral. Os livros são bem ou mal escritos. Eis tudo." Oscar Wilde.


Fica a dica.

"Rio Sex Comedy", 2010, Jonathan Nossiter


"Rio sex comedy" narra três histórias ambientadas no Rio de Janeiro.
Histórias desconexas mas que eventualmente se cruzam - desnecessariamente.


Charlotte (Charlotte Rampling) é gringa e cirurgiã especializada em operações relativas a mudança de sexo. Foi ao Rio com o intuito de 'ajudar' os menos favorecidos, oferecendo tal operação gratuitamente, imbuída por um sentimento de 'justiça social'. Entre uma e outra situação, desilusões e surpresas, Charlotte se depara com um Rio de Janeiro charmoso, convidativo e sensual. E passa a se preocupar com outras coisas...

William (Bill Pullman), embaixador americano, foi contactado para resolver uma situação diplomática e social no Rio de Janeiro. Ao chegar, depara-se com a sensação de que sua presença é inútil e sem fundamento - nem ele acredita numa solução para tal 'missão'. William, então, arranja um jeito de fugir - literalmente se enfia pela ruelas do Vidigal e desaparece. Tal fato gera na mídia o boato de que teria sido sequestrado por traficantes, claro...

E há Irène (Irène Jacob), uma socióloga vindo à cidade para pesquisar as relações entre patrões e empregados... (Dá para imaginar o que acontece, não?)

Charlotte e William acabam por conhecer outros gringos 'refugiados' no Rio, além de personagens carismáticos e típicos do Rio e do Brasil. Algo ao mesmo tempo divertido, carnavalesco e surreal.
Há de fato no roteiro alguma questão existencial bem colocada e discutida, assim como um retrato do Rio sob uma perspectiva internacional. Algo que incomoda e provoca um olhar diferente sobre as coisas à nossa volta.

Porém, como filme, não fica muito claro a intenção de Jonathan Nossiter com seu novo filme "Rio sex comedy".

Através de um texto atrevido e chistoso, o filme salienta particularidades da 'cultura' brasileira dentre elas o estado lastimável das favelas e a 'falta' de interesse do governo em ordenar tal caos. Tem como boa sacada a família indígena trazida para o morro, para servir como uma espécie de Simba Safári, um 'novo' ponto turístico que 'malandros cariocas' pretendem descolar.

Por outro lado, banaliza o tema do transexualismo, misturando-o a questões estéticas como plásticas e outras intervenções - há até participação de Ivo Pitanguy na fita.

Um filme que passeia pelo gênero comédia romântica' e com carinha de novela - um daqueles roteiros pretensiosos que gostam de abraçar 1.001 ideias e 'morrem na praia' por falta de síntese, base e boa amarração.

Por fim, no que concerne às atuações - as mais toscas, principalmente no que respeita ao elenco brasileiro.

Enfim, mais um samba do crioulo doido operado por um gringo maluco.


A dica não fica.

"Sunshine Cleaning", 2010, Christine Jeffs


Seu filho tem dificuldades de aprendizagem e necessita de uma escola especial.
Seu emprego "foi pro saco".

O que fazer???

'Sunshine Cleaning' LTDA, "claro".

Rose (Amy Adams), desesperada com tal situação, decide com a irmã, Norah (Emily Blunt), iniciar um novo negócio, digamos, insólito - higienização de locais onde ocorreram crimes.

Sim! O lado que o CSI não mostra!




A solução para todos os problemas... Será?

"Sunshine Cleaning" caminha na mesma onda que "Little Miss Sunshine"(2007).

Um filme sobre uma classe média que não 'deu certo' - seus dramas, receios e um sentimento de constante luta e devir. A relação das duas irmãs é posta à prova assim como o que ambas fizeram com suas vidas - adultas e sem dinheiro, profissão, nada de garantido ou seguro. Um filme que fala sobre desilusão e esperança.

O excelente Alan Arkin faz o pai, Joe: um homem que criou ambas sozinho mas que nunca conseguiu emplacar um negócio - um eterno frustrado.

O filme não possui um turning point claro, muito menos algo estrondoso - tem 1h30 de duração e se mantém flat com certa tranquilidade. Tem nas relações ali expostas apenas uma mensagem, ou uma moral:

Desistir para quê? Ou para quem? Quando é que paramos de lutar, mesmo?

Modesto, simples e com humor negro preciso e na medida certa, "Sunshine Cleaning" é um programa light, divertido e um passatempo agradável.

Emily Blunt & Amy Adams formam um dupla ultraentrosada e engraçada. Além de serem ótimas atrizes - dois nomes que ainda vão causar estardalhaço em Hollywood.

Megan Holley, a roteirista, chegou a conhecer duas mulheres que realizavam esse trabalho, algo que a tocou profundamente:

"Ela sentiam-se genuinamente honradas em poder 'ajudar'. Elas tinham uma atitude revigorante. Uma delas chamava o emprego de 'feel good' porque percebia que estavam 'ali' num momento sui generis e de extrema vulnerabilidade. Foi isso que me paralisou e me convenceu de que eu deveria criar uma história ao redor disso. Escrevo aquilo que me toca."


Fica dica!!

"Caligula", 2010, Gabriel Vilela


O texto de Albert Camus tem uma compreensão íntima e densa sobre a vida de Calígula. Excede a história em si e trilha uma ideia, uma 'logica' e um pensamento sobre o famoso imperador.

"Calígula" é uma peça que considera sua crueldade, extravagância e perversidade sexual, apresentando-o como um tirano demente, mas concentra a narrativa nos seus feitos, na sua 'popularidade' e na consciência que tinha de si e do poder em suas mãos - algo que 'se perdeu', de vez, após a morte de sua irmã e amante, Drusila.

Gabriel Vilela comanda um elenco que não só compreende isso com rigor como fornece (especialmente Claudio Fontana) um espaço para Thiago Lacerda se expor e elaborar o tema.

Uma peça feita com a ideia de trabalhar o conteúdo - fugindo, então, do óbvio. A direção optou por não mostrar/banalizar a questão sexual, tão marcante na vida de Calígula. Algo que se apresentou como uma licença poética cabível e sensata.

(A não ser para aquelas pessoas que nunca ouviram falar em Calígula - o que sugere, talvez, uma lacuna em aberto.)

Mesmo assim, Gabriel Vilela com o cenógrafo JC Serroni, escolheu montar um palco nada barroco, mas sóbrio e contemporâneo - as cenas são passadas numa espécie de praça ou pátio, onde o fundamental são as relações e o texto. Assim foi escolhido o figurino - roupas que parecem trapos e panos emaranhados em calças modernas, zíperes e botões -, tudo muito moderno e conciso.

No que concerne às atuações, "Caligula" apresenta momentos frágeis em que alguns atores se mostram rendidos por um texto de difícil execução. Mas nada atrapalha a jornada do protagonista. Thiago Lacerda está solto, livre e audaz. Faz daquelas palavras árduas um passeio, uma espécie de libelo, com o qual tenta, como Calígula, provar à plateia sua competência e raciocinio dentro da loucura que é ser imperador, líder do maior império que o mundo já viu. Thiago Lacerda se esbaldou.

Tem, ali, uma nítida homenagem ao caos oferecido e escancarado pelo Coringa de Heath Ledger em "Batman - O Caveleiro das Trevas", de Christopher Nolan. Segundo Thiago: "Caligula é um personagem metade gente, metade divino, em meio a um surto psicótico".

Thiago comemora seus 10 anos de carreira mostrando-se um ator ousado e com disponibilidade invejável. Tem um belo caminho pela frente.

"Caligula" certamente é uma forma atual de montar um 'clássico'. Vale a pena conferir as propostas de Gabriel Vilela e a atuação firme, árdua, excessiva e desvairada de Thiago Lacerda.

A 'entrada' de Edith Piaf fecha a peça com chave de ouro. Só vendo para entender.

Calígula foi isto: Um homem, que, assim como Tibério, 'recebeu' a 'pobre' incumbência de ser imperador; de ter nas mãos a vida de todo e qualquer homem. Como muito bem considerado pelo próprio Calígula:

- Eu existo desde a manhã do mundo e existirei até que a última estrela caia da noite. Apesar de ter tomado a forma de Gaius Caligula, eu sou todos os homens da mesma forma como não sou homem algum, e por isso sou um deus.


FICA DICA.

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O FILME

Em 1979, o mundo se viu dividido com o filme "Caligula", dirigido por Tinto Brass e Bob Guccione.

Um filme que mostrou ao mundo a história de Calígula, tirano que comandou o Império Romano. Tido como excêntrico e louco, orgíaco e sangrento, Caligula perpetuou-se no poder assassinando membros do senado e mudando leis e valores. Dentre o terror que estabeleceu, matou gente inocente e promoveu balbúrdias e confusão nas quais o povo se "divertia" com seu comportamento gaiato.

O filme de 1979 - arrasado pela crítica - ganhou o epíteto de um dos piores filmes já realizados. Pela primeira vez foi possível conferir atores 'conhecidos' - Malcolm Mc Dowell, Peter O'Toole, uma tenra Helen Mirren e John Gielgud - interpretarem personagens envolvidos em cenas de sexo explícito.

Um filme 'quase' pornográfico.

"Uma enxurrada de depravação de duas horas e meia que parece ter sido filmada através de um vidro de vaselina." Newsweek, 1979.

De fato, "Caligula" foi um filme ao qual faltou, basicamente, conteúdo.

Uma produção fantástica, atores excelentes e um retrato fiel, ousado e bizarro da vida de Calígula, a qual, segundo a História, era assim mesmo - uma sacanagem generalizada.

Porém, o filme se tornou, nada mais, nada menos, que - entre gozadas, paus e bundas - uma espécie de 'encenação da vida do imperador sacana' - parecido com programas do History Channel e National Geographic: Para uns, muito realista; para outros, puras suposições.

Como informação, vale a pena dar uma olhada.

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Finalmente,

[Para rir]

http://www.mtime.com/movie/94069/trailer/21141.html

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