quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

"Um lugar qualquer", 2011, Sofia Coppola


Não é necessário argumentar quando se diz que o homem é movido pelo desejo.


Qualquer pessoa tem como vontade fundamental ser feliz, e, para tal, deseja passar de um estado para outro; deseja, portanto, realizar “coisas”.

Um lugar qualquer dialoga com essa questão.

Jonhny Marco (Stephen Dorff) é um jovem ator, galã e astro do cinema americano. Chegou cedo à calçada da fama, com apenas 30 anos, e já dispõe de uma fortuna incomensurável. É adorado pelos quatro cantos do planeta e goza de uma vida de príncipe. Tem como "ativo" os filmes e propagandas que faz e como "passivo" uma Ferrari, hospedagens em hotéis luxuosos e uma filha de 11 anos, que faz questão de sua presença, já que, nos últimos anos, Johnny quase não apareceu.

Johnny, obviamente, tem claras dificuldades em se relacionar com as pessoas, além de habilidades sociais pouco eficientes. Decerto, um tímido convicto. Somado a isso (e, talvez, devido a isso), assim como milhares de pessoas, Johnny sofre de uma doença chamada - marasmo. Ao longo dos anos, foi se acomodando num estilo de vida pra lá de hedonista, em que as relações foram se tornando obsoletas e sem sentido. Johnny enclausurou-se numa bolha e deixou-se levar pelos paparicos que a fama lhe ofereceu. Ter tudo de bandeja, como se diz, tornou-o quase catatônico, impossibilitado de ir atrás de coisas significativas. Ele deixou apenas pequenos prazeres serem atendidos, aos poucos e sistematicamente; basicamente, levou-se a deixar sua vida de lado, dando espaço apenas para o personagem – o sensacional ator de Hollywood.

Pode-se dizer, então, que o novo filme de Sofia Coppola fala sobre a falta de uma inquietação, de um instinto desejante, que pode levar o homem ao coma ou ao nada. Fala sobre o homem que não se encontrou, que ainda não sabe o que quer - um assunto que toca a todos.

Sartre já dizia que a não escolha também é uma escolha.

Assim, para Johnny veio a depressão, e, junto com ela, uma sensação de vazio e impotencia diante da vida. Como ele mesmo constata no filme;



Eu não sou nem uma pessoa...

Sofia Coppola tem méritos. Seus filmes certamente ainda não são fascinantes; porém, seu olhar quase clínico sobre a vida dos outros e sua habilidade em transformar uma ideia, ou um olhar, em planos e quadros é, indiscutivelmente, invejável. Em ingles, poderíamos dizer: She seizes the moment! ("Ela 'captura' o momento!").

Às vezes, pessoas "ligam no automático certas atitudes, comportamentos e a própria obtenção de prazer, ficando completamente ausentes e ignorantes quanto a tais ações.

Um lugar qualquer narra a história de Jonnny, um cara que se ve estacionado e sem ter para onde ir. Um dos melhores papéis de Stephen Dorff. É muito bonita a transformação que a vida dele sofre quando sua filha a transpõe e os dois passam a dividir experiencias. O contato com a filha, algo com significado, move montanhas...

Sofia Coppola, de fato, compreendeu bem este universo - registra um olhar sensível e profundo. Há planos que falam por si só, "imageticamente" preenchidos de sentido.

Por outro lado, quanto ao conjunto final, Sofia exagerou nas tomadas e planos. O filme é contemplativo demais, chegando até a ser exaustivo e repetitivo. A montagem existe, talvez, a fim de aliviar a experiencia para aqueles que queiram algo mais fluido. Decerto a lentidão do filme quis imprimir a falta de volição do protagonista, mas, mesmo assim, seria possível faze-lo de outra maneira.

E outra coisa - enquanto Uxbal (Biutiful, 2010, A. Inarritu} faz de tudo para salvar seus filhos num universo pobre, sujo e desesperador, Johnny Marco faz de sua vida austera uma odisseia trágica...

Há um provérbio chines que diz assim - "Se voce acha que sua vida está ruim, compre um bode e o coloque na sala de estar..."

A dica fica. A menina sabe o que faz.

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