sexta-feira, 2 de julho de 2010

"O golpista do ano", 2010, Glenn Ficarra


Quem foi Steven Russell?

Simplesmente o maior cara-de-pau, picareta, dissimulado e criativo ‘bandido’ que a América já viu.

Este já é, talvez, um motivo para assistir “O Golpista do ano" [I love you, Philip Morris]. E quem vive o Sr. Steven Russel? Jim Carrey – Esta aí o segundo motivo.

Steven Russel (Jim Carrey) é uma daquelas pessoas que nasceram sem uma vocação. Adotado, sempre carregou uma dúvida – “de onde vim?” e “por que sou assim?”. Levou, inicialmente, uma vida simples e ordinária - Se tornou policial, se casou e formou família - mas algo lhe dizia que estava faltando alguma coisa.

E, assim, de repente, sua vocação apareceu e sobressaiu.

Steven Russel conseguiu forjar documentos, fingir-se competente e tapear processos burocráticos para sua admissão numa empresa de alimentos. Através de sistemáticas operações fraudulentas enriqueceu e alcançou posições que jamais pudera imaginar. Todavia, seus trambiques foram descobertos e apanhados e para a prisão Steven foi - como uma mão na frente e outra atrás.

Ali, descobriu-se gay e apaixonado por Phillip Morris (Ewan McGregor).

- Já daria um filme, não? Pois é, mas tem mais. E a parte mais cômica:

Durante o tempo que passou preso, estudou direito – conseguiu produzir documentos, elaborar uma defesa e manobrar recursos para obter a liberdade de seu amante Philip e dele próprio. Foi preso outras vezes e sempre conseguiu fugir personificando juizes, advogados, médicos e faxineiros. Em suma, sua vocação – a de malandro e ator. Como num circulo vicioso, Steven Russel, voltou a enganar, mentir e roubar e assim passou o resto da sua vida – saindo e entrando das prisões.

O golpista do ano” apresenta uma versão romantizada de sua história.

O interessante é justamente assistir O QUE ele fez e COMO ele o fez. De tão criativo, Steven ganhou notoriedade e um programa no Discovery Channel intitulado "On The Run – The King Of Cons". (Em fuga – O Rei dos Golpes).

Tanto o roteirista John Requa como o diretor Glenn Ficarra optaram em deixar Jim Carrey solto e criativo dando oportunidade para o comediante se esbaldar naquilo que faz melhor – ‘nonsense’ comedy - lado simpático da fita que transforma a história de Steven Russel numa engraçada e curiosa e não numa triste e trágica. Ewan McGregor faz um Philip afetado no ponto certo, com leveza e até bons momentos engraçados.

Um filme descontraidamente interessante que transita entre os gêneros comédia/drama de forma coerente com bom ritmo e graça infalível oferecida por ambos Jim Carrey e Ewan McGregor.

Uma sessão pipoca divertida!

Fica a dica.

"A carpa", 2010, Ary Coslov


Quando Denise Crispun e Melanie Dimantas resolveram escrever “A Carpa” estavam, provavelmente, intrigadas com uma sensação de desafinação com seus pais - algo trivial e ao mesmo tempo com certa importância. Ao passar dos anos, tradições e costumes tendem a se perder e serem esquecidas, e assim, aqueles mais velhos, tendem a acreditar em duas idéias – Primeiramente, que o mundo caminha para o fim dos tempos; e apoiado na 1ª noção, que eles devem permanecer rígidos propagando tal conduta e conhecimento, para o bem da nação. Qual é a família que não tem seus atritos, divergências e desacordos? No que concerne a religião e os costumes muitas vezes ocorrem embates entre a tradição e o moderno – um confronto de idéias e com visões divergentes.

A carpa” narra, justamente, este embate geração x geração. A filha (Carolyna Aguiar) acaba de chegar de viagem, veio passar o Pessach com seus pais. A mãe (Ivone Hoffman), como toda mãe, está animadíssima com a chegada da filha e já tem pronto quase toda a farta comida. A peça, toda passada na cozinha, apresenta, na relação mãe e filha, todo o universo da religião judaica – de um lado, as crenças, maneirismos e expectativas de uma mãe que não consegue se desprender da fé e que enxerga todos à sua volta como gói. Do outro, uma jovem moça que decidiu se casar com um não-judeu, e que enxerga neste casamento uma maneira mais flexível de se lidar com questões da fé e com a cultura em si. A mãe enxerga a filha aculturada, e a filha sonha em ter uma mãe mais resiliente.

“A carpa” reproduz com humor, um ambiente onde há, entre as duas, conversas, risadas e discussões das mais fervorosas – tudo isto enquanto preparam o famoso “Gefiltefish (a carpa recheada) um dos pratos tradicionais das celebrações judaicas.

Ivone Hoffman encarna, personifica e simboliza a figura da mãe judaica – algo que nesta fé representa o esteio, quem em grande parte, na família, determina o caráter e a atmosfera do lar. É através de uma interpretação leve, caseira e simples, mas ao mesmo tempo penetrante e inexorável que Ivone rende uma platéia atenta e que se deleita e emociona, ao ver uma mãe tipicamente provedora, protetora e energética. Ivone é a dona do palco.

A doce Carolyna Aguiar realiza o papel com habilidade e graça - atriz mais moça, talvez menos experiente, tem momentos em que deixa escapar um bradar e gritos que desequilibram a harmonia de algumas poucas cenas. Contudo, não deixa a desejar de forma alguma. É tão agradável quando há uma peça em cartaz que passa num tempo certo, de maneira enxuta e com sentido claro. Além de conter atores tão bem entrosados e um texto aparentemente casual mas solene e austero.

Os judeus, sem dúvida nenhuma, permaneceram uma nação distinta sem país, poder, território, ou cultura partilhada. Foram dispersos e quase sempre uma minoria. Na maior parte recusaram os esforços ativos para convertê-los, e resistiram à assimilação. Nenhum outro povo tem mantido sua identidade intacta por tanto tempo sob tais circunstâncias.

As vezes, cabe a uma mãe ser a responsável por tal - e a uma filha tentar ensiná-la a se flexibilizar, um pouco. E, assim, a vida vai.



Fica a dica.